sexta-feira, 7 de junho de 2013

A FUNÇÃO SOCIAL DO ENSINO DE HISTÓRIA DA ÁFRICA

História da África – função social do ensino de história na sala de aula.

Publicado: 24/04/2011 em História da África, Textos teóricos
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Recentemente o ensino de História da África tornou-se obrigatório no currículo escolar.  Materiais didáticos com conteúdo exclusivo de História da África, escrito por especialistas no assunto, têm sido desenvolvidos. No entanto, temos que nos perguntar o que os professores – especialmente os que têm mais tempo de profissão – já conhecem sobre, e o que esperam de um ensino de História da África.
Estudos acadêmicos mais recentes têm privilegiado a formação da nação e do Estado brasileiro dentro do chamado Sistema Atlântico Sul.  Deste modo, o Brasil é tido como o produto de um longo processo histórico oriundo de três matrizes civilizatórias diferentes: uma europeia, uma africana, e outra indígena. Já desde a década de 30 aproximadamente, especialmente com Gilberto Freyre em Casa-Grande & Senzala, as diferente matrizes culturais formativas do Brasil são reconhecidas. No entanto, o Brasil é ainda um país profundamente racista, onde o acesso dos negros a determinados ambientes ou condições é dificuldado. Mas então, se as diferentes matrizes culturais são reconhecidas na formação da cultura brasileira, como o Brasil pode ser ainda um país racista? E ainda, o que o ensino de História da África tem a ver com esta questão?
O ensino de história nos níveis fundamental e básico tem uma função social muito grande. Ela constrói personagens marcantes da história, eventos importantes para a construção do Brasil que conhecemos hoje, enfim, ela constrói a ideia de Brasil para o aluno: o que é o Brasil, quem é o brasileiro. De diversas datas e personagens, algumas são eleitas como principais para contar a história da nação. No entanto, por trás de toda escolha deste calibre existe uma ideologia que a orienta. Neste caso, onde estão as personagens negras da história do Brasil? Geralmente, nos manuais voltados para o ensino fundamental e médio, os eventos e personagens negras se concentram na colônia, o momento onde as “raças” (ou etnias, para utilizar um vocabulário mais adequado) se encontram. Sempre relacionados à escravidão, os negros parecem desaparecer da história após a abolição, no fim do Século XIX, salvo raras exceções como a revolta da chibata, por exemplo. A partir deste momento, toda a história do Século XX é contada como se existisse um povo brasileiro único, harmônico e coeso. E sempre branco.
Abordar a história dos afrodescendentes no Brasil a partir de suas contribuições culturais, geralmente resumidas ao samba (música), capoeira (dança), etc, é deixar de lado duas coisas: outras contribuições da matriz africana para a formação da nação brasileira – contribuições que se estendem, em última instância, até uma cultura política – e também a relação complicada entre os negros e brancos ao longo de cinco séculos de história. Por isso os livros de história devem resgatar personagens como Henrique Dias, que comandou um exército de negros contra os holandeses na América Portuguesa e também fez investidas contra Palmares. Devem tratar Palmares não como um ponto de convergência de escravos fugitivos, mas como a reprodução de um Estado africano na América, em um estrutura de Quilombo, espécie de aldeamentos militares que já existiam na África antes dos portugueses. Pensar a relação entre negros e brancos durante a revolta da vacina e, na postura de Getúlio Vargas com os negros em seu projeto de modernização da nação. Enfim, tratar de África e afrodescendentes na sala de aula é mostrar que o negro não trouxe apenas saudade, suor e ginga para o Brasil. Ele trouxe uma forma própria de compreender o mundo, que ajudou a moldar o país que conhecemos hoje. Tratar a história brasileira a partir de suas personagens brancas é desmerecer todo o sofrimento pelo qual passaram (e passam) os negros desse Brasil.
Link: Notícia publicada no jornal O Estado de São Paulo sobre a produção de materiais didáticos sobre História da África: http://www.estadao.com.br/noticias/vida,material-didatico-para-aulas-de-historia-da-africa-deve-ficar-pronto-no-segundo-semestre,702575,0.htm

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