A Revolta dos Centavos e seus
significados
José Vieira da Cruz
Professor e historiador
As manifestações contra o aumento
das tarifas de transporte coletivo, eclodidas em várias cidades do país no
curso dos últimos meses, têm chamado bastante atenção. Manifestações parecidas
já aconteceram no Brasil, a exemplo da “Revolta do Vintém”, ocorrida na cidade
do Rio de Janeiro, entre dezembro de 1879 e janeiro de 1880, quando os
resultados dos protestos conseguiram revogar o aumento da tarifa de bondes e
derrubar o Ministério que estava no poder. Na primeira metade da década de
1980, protestos contra o aumento das tarifas de ônibus, intercalados por
pichações e outras manifestações, compuseram o contexto de combate à ditadura
civil-militar e fizeram parte do processo de redemocratização em várias cidades
do país. E, mais recentemente, houve a “Revolta do Buzu”, ocorrido na cidade de
Salvador, em 2011. Essas revoltas e manifestações, não obstante suas
especificidades, têm em comum o combate ao aumento das tarifas de transporte
coletivo.
No caso das cidades de São Paulo
e do Rio de Janeiro, a visibilidade alcançada pelas manifestações ocorridas
neste mês de junho, obtiveram grande repercussão por causa de algumas atitudes
violentas. Se por um lado a ação de alguns manifestantes danificaram bens
públicos e privados; por outro, a forma como o Estado reprimiu tais atos
suscitou associações incômodas, dentre elas, destaca-se a memória da repressão
praticada pela ditadura civil-brasileira (1964-1985).
No cerne dessa associação, as
cenas de violência divulgadas pelos meios de comunicação e, sobretudo, postadas
nas redes sociais, têm dimensionado a ideia de que parte da sociedade
brasileira sente-se representada na ação dos manifestantes. Essa situação tem
colocado na defensiva tanto o governo do Estado São Paulo, do PSDB, quanto o
prefeito da cidade, do PT. Ambos sustentam a autorização do reajuste das
tarifas dos transportes coletivos e, de modo direto ou indireto, apoiam a ação
da polícia para manter a “ordem social”, divergindo apenas, em alguns
pontos, quanto ao uso desproporcional da força pelos policiais.
Mas, diante da repercussão
observada, em particular a produzida pelas redes sociais, pode-se dizer que
parte da sociedade passou a conferir mais atenção às ações dos manifestantes. É
possível que essa repercussão esteja causando algum tipo de incômodo a imagem
de gestores públicos municipais, estaduais e do próprio governo federal,
independente da legenda partidária. A intensidade desse incômodo pode fazer
alguns desses gestores se preocuparem com algo mais que a realização de copas e
dos Jogos Olímpicos. Seria esse um dos significados do que chamamos de “Revolta
dos Centavos”, em alusão a “Revolta do Vintém”?
Agora, nas disputas entre as manchetes, a Copa das
Confederações poderá sofrer concorrência de possíveis manifestações contra o
aumento das tarifas de transporte coletivo? O que será feito disto? Será que a
bandeira do não aumento das tarifas vai ser atendida? Outras bandeiras
surgirão? “Novos” atores políticos surgirão? O Estado repensará sua forma de
lidar com os manifestantes? A sociedade destinará mais atenção ao debate
político? Estas e outras perguntas serão respondidas durante ou após a Copa das
Confederações?
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